quinta-feira, 16 de outubro de 2008

Um pequeno histórico da Direita Brasileira

Saul Leblon*
Agência Carta Maior

Embora tenha definhado na maior parte do país, o velho udenismo, a ARENA e o PFL respiram especialmente em São Paulo, onde a expressiva votação de Gilberto Kassab (DEM) tem sido apontada como a maior obra do governador José Serra (PSDB) em todo o seu mandato.
A União Democrática Nacional (UDN), criada em abril de 1945 como uma trincheira belicosa de oposição a Getúlio Vargas (e que tinha em Carlos Lacerda, o “Corvo”, uma de suas expressões mais agressivas), fixou no país o ideário da luta contra a “subversão”, contra a reforma agrária, contra a liberdade sindical, contra a ampliação dos direitos sociais, contra a soberania nacional e contra a intervenção do Estado na economia.
A UDN foi extinta em 1964. O golpe militar que ela ajudou a organizar instituiu então o regime bipartidário e os udenistas se dividiram: a ala mais conservadora filiou-se à Aliança Renovadora Nacional (Arena), braço civil da ditadura militar, que em 1980 deu lugar ao PDS, Partido Democrático Social. A redemocratização permitiu um realinhamento ideológico mais amplo e deu nova expressão à estrutura político-partidária brasileira. O núcleo duro do PDS que tinha entre seus líderes Antonio Carlos Magalhães e Agripino Maia, indicados, respectivamente, como prefeitos biônicos de Salvador e Natal pela ditadura, fundou então, em 1985, o Partido da Frente Liberal, o PFL.
A maquiagem dos anos 90 garantiu generosos nacos de poder ao conservadorismo brasileiro, que experimentou um de seus píncaros de influência na coalizão de centro-direita (PFL-PSDB) que sustentou os dois mandatos tucanos até 2002. Embalava esse tour de force “modernizante” a meta-síntese explicitada por Fernando Henrique Cardoso, a saber, destruir o legado de Vargas do Brasil , o que incluía avançar sobre os diretos trabalhistas e promover o desmonte da presença do Estado na economia, requisito para escancarar nosso mercado ao livre fluxo de comércio e de capitais.
Apenas para citar alguns marcadores históricos, tivemos desde o final dos anos 70 o fim da censura (com avanços da imprensa independente), a Lei da Anistia, a primeira eleição para governadores, o ciclo das grandes greves operárias do ABC, a criação do Partido dos Trabalhadores, a Constituição de 1988, a derrubada de Collor, a eleição de Fernando Henrique Cardoso e a dupla vitória de Lula, em 2002 e 2006.
A direita brasileira não passaria impunemente por esse processo. Ele escancarou o rosto, a agenda e o discurso do PFL iluminando entranhas daquilo que havia de mais retrógrado e elitista no espectro político do país. Nas eleições de 2006 essa transparência mostrou-se letal: o PFL só elegeu o governador do Distrito Federal. Sua bancada encolheu de 84 deputados federais, eleitos em 2002, para 65. O ideário e a sigla haviam se tornado inviáveis sob as novas condições de vento e temperatura, impondo-se uma recauchutagem urgente para que o barco não viesse a afundar de vez.
Em 2007 as forças herdeiras da ARENA e da UDN promoveram uma retirada branca da cena política. Em março, o PFL trocou de nome e mudou sua face pública. Foi assim que surgiram os Democratas, inicialmente identificados como DEMO, tendo à frente uma nova geração da mesma cepa: em substituição a ACM (falecido) e a Bornhausen - enterrado vivo pelos eleitores - emergem Rodrigo Maia Filho e Antonio Carlos Magalhães Neto.
Em Natal, José Agripino conseguiu sucesso digno de registro ao vampirizar uma “celebridade” jovem que atende pelo sugestivo nome de Micarla. A filiada do PV assegurou assim a continuidade da hegemonia da direita na capital do Rio Grande do Norte. No Rio, a indiscutível sensibilidade reptilínea de César Maia (com Rodrigo Filho à tiracolo) já botou o ovo da serpente DEM na candidatura de Fernando Gabeira, declarando seu apoio a um personagem cuja trajetória –supostamente— poderá acrescentar alguma transfusão de sangue novo à direita brasileira.

Nenhum comentário: